O caminho até aqui

O que é exatamente uma dissertação, e como se deve escrever uma? Mais que isso, o que seria uma boa dissertação? Como se deve parecer esse pdf que eu devo escrever, paulatinamente, múltiplas vezes, ao longo de dois anos, resultado de um trabalho inspirado e dedicado de pesquisa?

Faz três semanas que eu iniciei meus estudos de mestrado e eu não sei ao certo.

A ideia deste blog é documentar meu processo de pesquisa. De outubro de 2021 até, eu espero, junho de 2023 eu terei percorrido uma jornada acadêmica (a primeira efetiva) e ter detalhes desse processo, que não podem ser escritos em um texto dissertativo argumentativo da ciência, me parece bom.

Pois bem, seguindo o título, o caminho até aqui:

Sou Giovanni Saluotto, um homem cis brasileiro do interior paulista. Iniciei minha graduação em 2016 na Universidade Estadual de Campinas (Unicamp) dentro do curso de Midialogia. Desde antes da matrícula, tinha como objeto de interesse o cinema, mesmo que naquele momento sem muita definição, sem muitas palavras precisas para delimitar o que me apetecia. Foi uma formação rica que é indissociável de quem eu sou hoje. Me formei em julho de 2021.

Em setembro de 2021 iniciei meus estudos de mestrado. Neste momento sou um étudiant da Université Sorbonne Nouvelle, em Paris, França. Fui aceito dentro do programa de Études Cinématographiques et Audiovisuelles, com um projeto de pesquisa entitulado "L’esthétique du cinéma de propagande de l’Estado Novo brésilien (1937-1945)". Meu orientador é o maître de cours M. Sebastien Layerle.

O projeto foi desenvolvido a partir do final de 2020. Meus dias eram divididos entre trabalhar em produtoras de vídeo e ler a bibliografia base da pesquisa. A ideia era escrever um projeto sobre cinema brasileiro, mas que pudesse se relacionar com cinemas europeus, pois acreditava que isso geraria maior interesse por parte das universidades francesas. O período do Estado Novo me pareceu interessante, simplesmente pelas ligações diretas com o nazismo e fascismo. Em pesquisas, rápidas em realidade, não encontrei uma produção bibliográfica muito proeminente, principalmente no que tange análises estéticas destes filmes. Foi nessa brecha que inscrevi meu projeto.

O processo de sua escrita foi conturbado, como deve ser de qualquer pesquisador iniciante, porém o resultado foi decente o suficiente para ser aceito em alguns cursos.

Uma vez na França, voltei aos trabalhos, e agora, com apenas três semanas de leituras e reflexões, já percebo que ele vai mudar muito. De início, pela simples vontade de caprichar. Como alguém que quer seguir uma carreira na academia, quero que minha dissertação tenha fôlego, produza um conhecimento relevante, não possa ser ignorada por pesquisadores do meu campo. Isto é difícil na minha posição atual. De início porque me falta leitura e bagagem, mas também pela minha condição de não bolsista que me faz continuar a trabalhar como editor e motion designer, logo possuindo outras responsabilidades, para além de pesquisar.

Mas não estou desanimado. Muito pelo contrário, reconhecer esses limites é reconhecer também o melhor trabalho que posso fazer, e sinto que é este o movimento que faço agora: como transformo meu projeto para que meu trabalho de pesquisa renda os melhores frutos lá na defesa?

Estou muito influenciado pelo Umberto Eco de Como Escrever uma Tese. É minha principal leitura do momento, e tem provocado boas reflexões.

Hoje mesmo, foi meu primeiro dia dentro da Biblioteca Nacional da França (a BnF). Fui lá pois é o único lugar (ou um dos únicos) com livros sobre o cinema brasileiro publicados por nós em português. Peguei a linda Enciclopédia do Cinema Brasileiro, organizada pelo professor Fernão, e ela já me suscitou dúvidas sobre meu corpus fílmico.

Também fiquei pensando na loucura que é ir para a França pesquisar cinema brasileiro, ainda mais desse período estadonovista que não está digitalizado e é preciso ir às cinematecas. Mas aí penso que nem no Brasil isso é possível agora, e que sempre é bom ter mais motivos ainda para voltar.

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